domingo, 1 de junho de 2008

Ah, O Bicho-Homem, O Homem-Bicho...


A espécie humana, talentosíssima na prática não tão estimada da autodestruição, possui uma característica que a torna essencialmente contrastada às demais criaturas que ilustram graciosamente nossas belas paisagens naturais: a capacidade auto-analítica, que se revela por meio da possibilidade de voltar sua atenção para seus próprios botões, e dessa forma, buscar entender o caos de vetores que figuram no seu âmago (consideremos as medíocres exceções). 

No mesmo impulso, "somos” (é bom identificar meus laços parentescos) capazes de focar nossas habilidades cognitivas no meio externo, investigando os fenômenos  desordenados e confusos  que regem  o balé cósmico. Denominada "consciência", essa seria a sumidade própria dos mamíferos bípedes dotados de princípios supostamente morais. A faculdade intelectual de tomar conhecimento do dito cujo “conhecimento”.

Compreendendo duas dimensões principais: a conscientização do "eu” (incluindo o eu - lírico...), que seria o entendimento dos elementos internos, responsáveis pela celeuma dos estados emotivos etc., caracterizando assim, um estado de "reflexão", imprimindo-se através da linguagem; e a conscientização do outro: que compreende o entendimento do mundo externo, obtido através de experiências empíricas sensoriais. Usando os sentidos que nos foram conferidos com suas finalidades próprias, ou seja: confundir as funções de um sentido com a de outro pode acarretar situações desagradáveis...

Para que o sujeito obtenha o nível de escrúpulo que pode vir a alcançar a denominação de “consciência crítica”, se faz necessário o desenvolvimento de ambas as dimensões, de modo equilibrado, já que a progressão aprofundada de apenas uma das destrezas mentais, ao passo que a outra se mantenha estagnada, resultará numa visão deformada da realidade dos fatos. Desenvolvendo-se dessa forma, o indivíduo estará condenado a enxergar e compreender o mundo sob uma perspectiva distorcida. Avistará as coisas da forma que lhe convém, empreendendo atitudes que lhe parecerem convenientes; o que nem sempre pode ajudar numa relação inicialmente pensada para ser saudável...

Uma vez que a consciência cresça de forma unilateral, elaborando, por exemplo, apenas o ponto de vista focado ao meio externo, desvalorizando o entendimento pessoal, naturalmente haverá uma constante crise de identidade, submetendo-se ao juízo de alteridade, desbocando uma perda de autonomia intelectual no embate com o mundo. Podendo resultar como conseqüência, de toda essa transposição das atenções para um ponto de vista externo, uma crescente crise existencial.

Da mesma forma, a profunda interiorização do indivíduo, ocasiona um intimismo exarcebado, um fechamento empacotado do homem diante das “coisas externas”. O típico sujeito com pontos de vista gritantemente subjetivos, resultando em um exagero ego-centrista. Tratando desse assunto, me vêm à mente os versos de Sá Carneiro, poeta português:

“Perdi-me dentro de mim

Porque eu era labirinto,

E hoje, quando me sinto,

É com saudades de mim...”

Portanto, o desenvolvimento concomitante é imprescindível para uma visão coerente e comedida, que garanta uma adequada coordenação de idéias. Para uma convivência menos angustiante se faz pertinente o balanceamento de noções, que se resume no autoconhecimento dos limites intrapessoais considerando-se parte de um todo maior: o extra pessoal. Reconhecendo e elaborando seu entendimento perante as fronteiras do mundo interior, este dentro de um mundo exteriorizado.

Viver e manter a mente em níveis considerados psiquiatricamente normais é definitivamente um grande desafio... A tênue fronteira que nos separa de um diagnóstico de loucura é mais frágil do que supõe nossa vã filosofia. Como um dos pilares de nossos estudos filosóficos ocidentais, Aristóteles, um dia afirmou: “A virtude está no meio!”. Não interpretando essa sábia afirmação como "estar sempre em cima do muro", nunca tomando partido em nenhuma idéia, nem assumindo suas vocações intimistas... É um grande passo que o sujeito dá com o intuito de preservar seus raciocínios lógicos.

Podendo desse modo, dizer que, continua ostentando coerência nesse mundo corrompido por loucuras pessoais e coletivas!

Um comentário:

Unknown disse...

Que reflexão você fez sobre o ser humano. Muito interessante. Para mim os piores são aqueles que não se posicionam e todo o tempo se mantém em cima do muro, deixando que os outros tomem atitudes, que de um jeito ou outro irá atingí-lo também.

http://maynabuco.blogspot.com/